Há uns dias atrás houve uma nova investida a favor da caça dos meros nos Açores. Como tive oportunidade de escrever num jornal diário da ilha de São Miguel, eu sou contra a caça destes magníficos animais. Enquanto decisor, por vezes, temos de ser complacentes com coisas que nos desagradam, mas, neste caso em particular, tudo aponta para a coerência e inteligência da manutenção desta proibição.
Passados poucos dias, trouxeram-me à Ilha do Corvo as festividades de Nossa Senhora dos Milagres. Aproveitei o facto de estar na ilha para fazer a monitorização de alguns locais de mergulho. Nas zonas mais costeiras, em vésperas de Gordon, pude ver as espécies previsíveis e muitos sargos-vulgares (Diplodus vulgaris), aqueles que apenas há pouco tempo apareceram nos Açores e que agora competem com o habitual sargo desta zona geográfica (Diplodus sargus cadenati). Como estes peixes apareceram em todas as ilhas dos Açores, praticamente em simultâneo, não é considerada uma introdução, mas sim uma alteração da distribuição natural. Eventualmente, terá sido provocada pela intensificação das alterações climáticas globais. Tudo isto para dizer que é normal e não merece mais do que uma anotação lacónica: “também aqui estão”.
Outro dos locais que tinha de ser monitorizado era o famosíssimo “Caneiro dos Meros”. Apesar de não haver uma empresa dedicada ao turismo de mergulho com escafandro autónomo na ilha do Corvo, o que me parece triste, praticamente todos os dias ali vi embarcações de mergulho originárias da ilha das Flores. Este simples sinal fez-me crer que o Caneiro continuaria a manter as suas características, mas tinha de verificar.
O “Caneiro dos Meros”, como o nome indica, é um vale que, neste caso, se prolonga desde profundidades menos elevadas, cerca de 12 metros, até aos 40. A descida entre os 20 e os 40 metros é praticamente imediata e é aqui que se encontram os meros. Pela simples leitura da profundidade, quando caí dentro de água pude verificar que me tinham colocado longe do local adequado. Tive que nadar um bom bocado para poder chegar ao local de “encontro”. Quando lá cheguei já tinha pouco tempo de mergulho e, pensei, já não iria ver nada. Os meros exigem que os mergulhadores lá cheguem e aguardem e, quando suas majestades desejam, aparecem. Apesar disso, ainda vi três meros, sendo que um deles tinha um porte já considerável. No entanto, não era o “Caneiro dos Meros” que esperava. Cheio de peixe, sim, com muitos corais negros, sim, mas não tinha os meros gigantescos que lá deveriam estar.
Fiquei preocupado. Estaria em risco a mais antiga reserva voluntária do país, já com 14 anos? Estaria em perigo um dos mais emblemáticos locais de mergulho de Portugal? Teriam desaparecido os meros vivos mais idosos de que tenho conhecimento?
Discretamente, partilhei estas preocupações com os meus amigos mergulhadores e eles comigo. De facto, já não os viam há algum tempo. Poucos dias depois, um amigo telefonou-me: “Frederico, oito meros incluindo o Pintas!” Vivos e fotografados. Respirei de alívio. É evidente que o Pintas não irá viver para sempre, como qualquer organismo vivo. No entanto, é sempre bom saber que este companheiro, que já conhecemos há 14 anos ainda por ali está e apenas porque os corvinos assim o querem. É um excelente exemplo a que apenas carece um investidor que, com base no Corvo, explore também este manancial. Empreendedores, procuram-se!